Nossa Senhora da Corrente


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Lêdo Ivo »»
 
Finisterra (1972) »»
 
Italien »»
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Nossa Senhora da Corrente
Notre Dame des Courants d'Air


Só Deus e os morcegos habitam
a Igreja de Nossa Senhora da Corrente.
O espírito invisível paira entre os altares
roídos e o vento de Penedo
cega lentamente os olhos dos santos
que os turistas e antiquários não conseguiram roubar.
Deus é barroco. Deus é como os morcegos:
voando à noite entre os espaços estrelados
procura chupar o sangue dos homens
que enegrecem o dia com os seus pecados.

Na abóboda da igreja que o rio às vezes invade
os morcegos escondem o céu alegórico
eternamente sonegado aos pecadores.
O céu negro dos homens! Sob o soalho avariado
os ratos se inclinam à Presença eucarística.
 E Nossa Senhora da Corrente, padroeira dos ratos e morcegos,
entre flores de papel e velas fedorentas
compartilha da solidão divina.
Ó Mãe dos homens, que sorri radiosa em seu abandono
como a minha própria mãe, rogai por mim!
Seul Dieu et les chauves-souris habitent
l'église de Notre Dame des Courants d'Air.
Un esprit invisible plane entre les autels
en ruine et le vent de Penedo
rend aveugle avec lenteur les yeux des saints
que les touristes et les antiquaires n'ont pas réussi à voler.
Dieu est baroque. Dieu est comme les chauves-souris :
La nuit venue, elles volent entre les espaces étoilés
cherchant à sucer le sang des hommes
qui noircissent le jour de leurs péchés.

Sous les voûtes de l'église que la rivière envahit parfois
les chauves-souris masquent le ciel allégorique
éternellement refusé aux pécheurs.
Le ciel noir des hommes ! Sous le plancher défoncé
les rats s'inclinent devant la Présence eucharistique.
 Et Notre Dame des Courants d'Air, patronne des rats et des chauves-souris,
entre fleurs en papier et bougies malodorantes
participe à la divine solitude.
O mère des hommes qui sourit, radieuse, abandonnée
prie pour moi ! comme le ferait ma propre mère.
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Carl Eduard Ferdinand Blechen
Église gothique en ruine (1835)

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