Os morcegos


Nom :
 
Recueil :
 
Autre traduction :
Lêdo Ivo »»
 
Finisterra (1972) »»
 
Italien »»
«« précédent / Sommaire / suivant »»
________________


Os morcegos
Les chauve-souris


Os morcegos se escondem entre as cornijas
da alfândega. Mas onde se escondem os homens,
que contudo voam a vida inteira no escuro,
chocando-se contra as paredes brancas do amor?

A casa de nosso pai era cheia de morcegos
pendentes, como luminárias, dos velhos caibros
que sustentavam o telhado ameaçado pelas chuvas.
"Estes filhos chupam o nosso sangue", suspirava meu pai.

Que homem jogará a primeira pedra nesse mamífero
que, como ele, se nutre do sangue dos outros bichos
(meu irmão! meu irmão!) e, comunitário, exige
o suor do semelhante mesmo na escuridão?

No halo de um seio jovem como a noite
esconde-se o homem; na paina de seu travesseiro,
  [na luz do farol
o homem guarda as moedas douradas de seu amor.
Mas o morcego, dormindo como um pêndulo, só guarda
  [o dia ofendido.

Ao morrer, nosso pai nos deixou (a mim e a meus oito irmãos)
a sua casa onde à noite chovia pelas telhas quebradas.
Levantamos a hipoteca e conservamos os morcegos.
E entre as nossas paredes eles se debatem: cegos como nós.

Les chauves-souris se cachent sous les corniches
de la douane Mais où se cachent les hommes,
qui eux aussi volent toute leur vie dans l'obscurité,
se cognant contre les blanches parois de l'amour ?

La maison de notre père était pleine de chauves-souris
qui pendaient comme les luminaires des vieilles charpentes
soutenant le toit menacé par les pluies.
« Ces fieux nous sucent le sang », soupira mon père.

Quel homme jetterait la première pierre à ce mammifère
qui, comme lui, se nourrit du sang des autres animaux
(mon frère ! mon frère !) et, communautaire, exige
la sueur de son semblable, même dans l'obscurité ?

Dans l'aréole d'un sein aussi jeune que la nuit
est caché l'homme ; dans les fanes de son oreiller,
  [sous la lumière du phare
l'homme conserve les pièces d'or de son amour.
Mais la chauve-souris, qui dort comme un pendule, ne fait
  [que se préserver du jour qui l'offense.

En mourant, notre père nous laissa (à moi et à mes huit frères)
sa maison où il pleuvait la nuit traversant les tuiles brisées.
Nous avons levé l'hypothèque et conservé les chauves-souris.
Et entre nos murs, elles se débattent : aveugles comme nous.

________________

Matteo Massagrande
Intérieur abandonné (2016)

Aucun commentaire:

Enregistrer un commentaire

Nuage des auteurs (et quelques oeuvres)

A. M. Pires Cabral (44) Adolfo Casais Monteiro (36) Adriane Garcia (40) Adão Ventura (41) Adélia Prado (40) Affonso Romano de Sant'Anna (41) Al Berto (38) Albano Martins (41) Alberto Pimenta (40) Alexandre O'Neill (29) Ana Cristina Cesar (38) Ana Elisa Ribeiro (40) Ana Hatherly (43) Ana Luísa Amaral (40) Ana Martins Marques (48) Antonio Brasileiro (40) António Gedeão (37) António Ramos Rosa (39) Antônio Brasileiro (1) Antônio Cícero (40) Augusto dos Anjos (50) Caio Fernando Abreu (40) Carlos Drummond de Andrade (43) Carlos Machado (112) Casimiro de Brito (40) Cassiano Ricardo (40) Cecília Meireles (37) Conceição Evaristo (33) Daniel Faria (40) Dante Milano (33) David Mourão-Ferreira (40) Donizete Galvão (41) Eugénio de Andrade (34) Ferreira Gullar (40) Fiama Hasse Pais Brandão (38) Francisco Carvalho (40) Galeria (30) Gastão Cruz (40) Gilberto Nable (48) Hilda Hilst (41) Iacyr Anderson Freitas (41) Inês Lourenço (40) Jorge Sousa Braga (40) Jorge de Sena (40) José Eduardo Degrazia (40) José Gomes Ferreira (41) José Régio (31) José Saramago (40) João Cabral de Melo Neto (43) João Guimarães Rosa (33) João Luís Barreto Guimarães (40) Luis Filipe Castro Mendes (40) Lêdo Ivo (33) Manoel de Barros (36) Manuel Alegre (41) Manuel António Pina (33) Manuel Bandeira (39) Manuel de Freitas (41) Marina Colasanti (38) Mario Quintana (38) Miguel Torga (31) Murilo Mendes (32) Mário Cesariny (34) Narlan Matos (85) Nuno Júdice (32) Nuno Rocha Morais (483) Pedro Mexia (40) Poemas Sociais (30) Poèmes inédits (292) Pássaro de vidro (52) Reinaldo Ferreira (40) Ronaldo Costa Fernandes (42) Rui Knopfli (43) Rui Pires Cabral (44) Ruy Belo (28) Ruy Espinheira Filho (43) Ruy Proença (41) Sophia de Mello Breyner Andresen (32) Tesoura cega (35) Thiago de Mello (38) Ultimos Poemas (103) Vasco Graça Moura (40) Vinícius de Moraes (34)