Quadrilátero


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Iacyr Anderson Freitas »»
 
A soleira e o século (2002) »»
 
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Quadrilátero
Quadrilatère


   A Fani Bracher

Antes era a montanha, o vale
sem divisa ou arresto.
Os colchões verdes da flora.

Agora deram de desmontar
a paisagem, cavar a ossatura dos montes.
Aos passantes o grosso intestino,
as tripas e fezes da terra.

Os urubus presidem a mesa.
Nossa fome tem a mesma cor
ferruginosa. Igual e insuportável
hálito.

Mas o minério compensa esse crime.
Oremos em demanda de seus ouros.

Antes era a montanha,
agora uma planície
quase mar.

Planície de mar-cemitério
com suas campas de lama,
alagadiços surreais, crematórios,
molossos, lodaçais fúnebres.

Enfim podemos erigir
um planeta há muito desabitado.

Deixemos esses motores
mais cem anos, façamos
maior o estrago.

Ó meus irmãos, meus dessemelhantes
na carne e no espírito, eu vos convoco,

com paixão, com dolorosa paixão, oremos.
   À Fani Bracher

Avant, c’était la montagne, la vallée
sans division ni séquestre.
Les matelas verts de la flore.

Maintenant ils ont démonté
le paysage, creusé l’ossature des collines.
Aux passants le gros intestin,
les tripes et les fèces de la terre.

Les urubus président à la table.
Notre faim a la même couleur
ferrugineuse. Une pareille haleine est
insupportable.

Mais le minerai compense ce crime.
Prions pour la recherche de leur or.

Avant c’était la montagne,
maintenant une plaine
presque la mer.

Plaine d'un cimetière-marin
avec ses tombes de boue,
marécages surréalistes, crématoires,
molosses, bourbiers funèbres.

Nous pouvons construire enfin
une planète depuis longtemps inhabitée.

Laissons ces moteurs
encore cent ans, faisons
encore plus de dégâts.

Ô mes frères, mes dissemblables
dans la chair et dans l’esprit, je vous invoque,

Avec passion, avec une passion douloureuse, prions.
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Ignace Francois Bonhomme
Exploitation minière à ciel ouvert à Vieille Montagne, Saône-et-Loire (1854)
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