Uma árvore


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Uma árvore
Un arbre


   para José Afrânio M. Duarte

A única imagem pessoal:
aquela árvore sob a chuva,
impassível e dura.

A cidade à deriva,
cortinas alvas avançando mais e mais
para a noite, por duas semanas
– e nenhum azul, nenhuma réstia
de luz ou lume.

Casas com âncoras nos batentes.
Lodo, lixo, limo. A paisagem
começa a empalidecer.
Mal se adivinha a montanha ao lado.

Uma densa parede sela a vista.
As águas tracionam terra e céu.
Agora tudo compõe
uma irmandade
sem contornos.
O que era realidade
vai girando
sua manivela.

Mesmo a topografia se curva
ao temporal, sem pressa.

Alheia ao desespero,
apenas aquela árvore.

Impassível em sua metáfora, entregue
à total condenação:

estar na chuva, sob o jugo,
testemunhar a tudo,
avessa ao céu e ao chão
   à José Afrânio M. Duarte

Seule image personnelle :
cet arbre sous la pluie,
impassible et dur.

La ville à la dérive,
rideaux clairs s'enfonçant de plus en plus
dans la nuit, durant deux semaines
– et aucun bleu, aucun filet
de lumière ou de feu.

Maisons avec leurs ancres, aux battants.
Boue, ordures, limon. Le paysage
commence à blêmir. C'est à
peine si l'on devine la montagne voisine.

Un mur épais scelle la vue.
Les eaux se cambrent et tirent ciel et terre.
Maintenant tout se compose
d'une fraternité
sans contour.
Ce qui était réel
va tourner
sa manivelle.

Même la topographie se courbe
sous la tempête, sans hâte.

Indifférent au désespoir,
rien que cet arbre.

Impassible dans sa métaphore, livré
à une condamnation totale :

être sous la pluie, sous le joug,
témoigner de tout,
à l'encontre du ciel et du sol.
________________

Théodore Rousseau
Coucher de soleil près d'Arbonne (1846)
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