Não sou o herói do dia


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Não sou o herói do dia
Je ne suis pas le héros du jour


Não sou o herói do dia.
A vida me obrigou
a comparecer, sem convite, ao banquete,
em que me vejo, agora, erguendo a taça,
não sei a quem.
Soldado que lutou sem querer, por força
do original pecado, e em cujo peito não fulgura,
até hoje, nenhuma
condecoração.

Não sou o herói do dia. Passei pela vida
como quem passa
por um jardim público, onde há uma rosa proibida
por edital.
A rosa de ninguém, a rosa anónima
que aparece jogada sobre o túmulo
do desconhecido, todas as manhãs.

É bem verdade que, em menino, eu possuía uma banda
 de música
que tocava no circo, acompanhava enterro,
que tomava parte em procissão de encontro
e nos triunfos da legalidade.
Hoje, porém, - pergunto -, onde o pistão, o bombardino,
 o saxofone, a flauta, a clarineta,
os instrumentos todos dessa banda de música?
Todos quebrados, os respectivos músicos caídos
num só horizonte.
Minha banda de música, se existe,
é agora
de homens descalços e instrumentos mudos.

Não sou o herói do dia.

Ah, o silêncio
de alguns amigos que deviam falar e não falam.
O grande silêncio
da banda de música que devia tocar e não toca.
O silêncio espantoso
de quem devia estar gritando
desesperadamente, e ficou quieto.
E ficou quieto, sem explicação.
Maestro, não é hora de tocar-se o hino nacional?

Ah, positivamente,
não sou o herói do dia!
Je ne suis pas le héros du jour.
La vie m’a obligé
à assister, sans invitation, au banquet,
où je me vois maintenant, levant ma coupe
à je ne sais qui.
Un soldat qui s'est battu sans l'avoir voulu, à cause
du péché originel, et sur la poitrine duquel,
à ce jour, aucune
décoration ne brille.

Je ne suis pas le héros du jour. J’ai vécu ma vie
comme celui qui passe
par un jardin public, où il y a une rose interdite
par décret.
La rose de personne, la rose anonyme
que l'on voit là jetée sur la tombe
de l’inconnu, tous les matins.

Il se trouve que j'appartenais, étant petit, à un groupe
  de musiciens
qui jouait au cirque, assistait aux funérailles,
participait aux processions
et aux triomphes de la légalité.
Mais aujourd’hui - je me demande -, où sont l’euphonium ou
 tuba ténor, le piston, le saxophone, la flûte, la clarinette,
Tous les instruments de ce groupe de musique ?
Tous brisés, et leurs musiciens respectifs tombés
sur le même front.
Mon groupe de musique, s’il existe,
est maintenant
celui des hommes pieds nus et des instruments muets.

Je ne suis pas le héros du jour.

Ah, le silence
de certains amis qui devraient parler et ne le font pas.
Le grand silence
de ce groupe de musique qui devrait jouer et ne joue pas.
Le silence stupéfiant
de ceux qui devraient crier
désespérément, et reste silencieux.
Et restent ainsi sans explication.
Maestro, n’est-il pas l'heure de jouer l’hymne national ?

Ah, décidément,
Je ne suis pas le héros du jour !
________________

Nicolas de Staël
Les musiciens - Ricordo di Sidney Bechet (1952-1953)
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