Elogios de Nicanor Parra - II


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Elogios de Nicanor Parra - II
Éloges de Nicanor Parra - II


Aritmética da lama
(Brumadinho - MG, janeiro de 2019)

Independentemente
das centenas de desaparecidos,
e dos corpos soterrados,
jovens, grávidas e crianças,
as gargantas entupidas de densa lama.
Independentemente
da destruição da paisagem,
dos rios, da fauna e da flora.
Quanto vocês pensam que custa,
em dinheiro vivo e sonante,
a construção de uma barragem?
Barragens custam caro.
Quanto mais seguras, mais caras.
E a manutenção de milhares de funcionários,
com suas famílias, numerosas,
funcionários insubmissos e indolentes?
Quanto vocês pensam que custa manter
uma grande empresa,
e seu nome no mercado,
sua estabilidade na bolsa?
Uma bagatela?
São enormes investimentos.
E os impostos pagos para os municípios,
os estados e o país?
Commodities viram dinheiro.
E o que se gastará com indenizações e enterros,
missas e coroas de flores?
Uma fortuna!
Além do que já fazemos,
e das propinas,
e dos laudos prontos
pagos a peso de ouro
(e não de ferro).

Em nome de Deus!
E do tempo perdido
em explicações inúteis,
para a imprensa,
os familiares insaciáveis?
O dinheiro não só fala,
como faz muita gente calar a boca.
Quase quatrocentos mortos.
Doação de cem mil para a família
de cada soterrado vivo.
Sem falar nas despesas que virão!


Independentemente
de qualquer outra coisa,
sejamos um pouco sensatos,
minimamente sensatos,
por favor:
é só fazer uma mísera regra de três.


Arithmétique de la boue
(Brumadinho - MG, janvier 2019)

Indépendamment
des centaines de disparus,
et des corps ensevelis,
jeunes, femmes enceintes, enfants,
leurs gorges obstruées par la boue.
Indépendamment
de la destruction du paysage,
des rivières, de la faune et de la flore.
Combien pensez-vous que coûte,
en monnaie sonnante et trébuchante,
la construction d'un barrage ?
Les barrages coûtent cher.
D'autant plus sûrs, d'autant plus chers.
Et la main-d’œuvre de milliers de travailleurs,
avec leurs familles, nombreuses,
travailleurs insoumis et paresseux ?
Combien pensez-vous que coûte
la maintenance d'une grande entreprise
et son nom sur le marché,
sa stabilité en bourse ?
Une bagatelle ?
Ce sont d'énormes investissements.
Et les impôts payés aux municipalités,
aux régions et à l'État ?
Commodities deviennent argent.
Et ce qui sera gaspillé en indemnités et enterrements,
messes et couronnes de fleurs ?
Une fortune !
En plus de ce que nous avons déjà fait,
et des pots-de-vins,
et des évaluations rapides
payés au poids de l'or
(et non du fer).

Au nom de Dieu !
Et du temps perdu
en explications inutiles,
à la presse, aux membres
insatiables de la famille ?
L’argent ne fait pas que parler,
il fait taire aussi beaucoup de gens.
Près de quatre cents morts.
Don de cent mille à la famille
pour chaque enterré vivant.
Sans compter les frais qui viendront !


Indépendamment
de tout autre chose,
soyons un peu raisonnables,
a minima raisonnables,
s’il vous plaît :
il ne reste à faire qu'une misérable règle des trois.

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Maison sous la boue de Brumadinho
Photo : Jeso Carneiro (février 2019)
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