Fala o arrumador de automóveis


Nom :
 
Recueil :
 
Autre traduction :
António Osório »»
 
A Ignorância da Morte (1978) »»
 
Italien »»
«« précédent / Sommaire / suivant »»
________________


Fala o arrumador de automóveis
Le gardien du parking parle


Assustado com a miséria e estes anos,
pouco espero de Deus e dos homens.
Não mendigo, olho de soslaio, adivinho,
sem gratidão guardo no bolso os óbolos.
E fui pescador, depois faroleiro: longe
deitava a alma, relâmpago
sobre falésias, em estrelas tocava,
a sirene era o meu grito de amor.
Transluzente e distante e bom
como clarões de um farol nunca foi fácil:
algo se afundava debaixo de mim,
desconhecida culpa. Odeio, sim, odeio
este parque onde chuva e sol impõem as mãos
e na pele penetram sem bálsamo.
Primeiro a luxúria, depois vinho,
escuridão. No fundo de um poço
cujas paredes ressumam lágrimas e avencas.
Custa ganhar a vida e perdê-la.
Tudo foi defraudado, sou eu
eu ou alguém por mim - quem aperta
desde a infância o nó que me estrangula.
Épouvanté par la misère et les années,
j'attends peu des hommes ou de Dieu.
Je ne mendie plus, regard de biais, j'évalue
l'obole et la mets dans ma poche sans gratitude.
J'ai été pêcheur, puis gardien de phare : au loin
j'ai laissé mon âme, lumière
sur la falaise, au toucher des étoiles,
la sirène était mon cri d'amour.
Translucide, lointaine et bonne
comme l'éclat d'un phare, ce ne fut jamais facile :
au-dessous de moi, une chose s'est effondré,
culpabilité inconnue. Je déteste, oui, je déteste
ce parking où pluie et soleil s'abattent sur vos mains
et pénètrent votre peau sans baume.
Tout d'abord la débauche, puis le vin,
l'obscurité. Au fond d'un puits
d'où suintent des parois, larmes et fougères.
Difficile de gagner sa vie et de la perdre.
On m'a escroqué tout le temps, c'est moi
- moi ou quelqu'un pour moi - qui a resserré
le nœud qui m'étrangle depuis l'enfance.
________________

Andrew Wyeth
Phare abandonné (1977)
...

Aucun commentaire:

Enregistrer un commentaire

Nuage des auteurs (et quelques oeuvres)

A. M. Pires Cabral (44) Adolfo Casais Monteiro (36) Adriane Garcia (40) Adão Ventura (41) Adélia Prado (40) Affonso Romano de Sant'Anna (41) Al Berto (38) Albano Martins (41) Alberto Pimenta (40) Alexandre O'Neill (29) Ana Cristina Cesar (38) Ana Elisa Ribeiro (40) Ana Hatherly (43) Ana Luísa Amaral (40) Ana Martins Marques (48) Antonio Brasileiro (41) Antonio Osorio (17) António Gedeão (37) António Ramos Rosa (39) Antônio Cícero (40) Augusto dos Anjos (50) Caio Fernando Abreu (40) Carlos Drummond de Andrade (43) Carlos Machado (112) Casimiro de Brito (40) Cassiano Ricardo (40) Cecília Meireles (37) Conceição Evaristo (33) Daniel Faria (40) Dante Milano (33) David Mourão-Ferreira (40) Donizete Galvão (41) Eugénio de Andrade (34) Ferreira Gullar (40) Fiama Hasse Pais Brandão (38) Francisco Carvalho (40) Galeria (30) Gastão Cruz (40) Gilberto Nable (48) Hilda Hilst (41) Iacyr Anderson Freitas (41) Inês Lourenço (40) Jorge Sousa Braga (40) Jorge de Sena (40) José Eduardo Degrazia (40) José Gomes Ferreira (41) José Régio (41) José Saramago (40) João Cabral de Melo Neto (43) João Guimarães Rosa (33) João Luís Barreto Guimarães (40) Luis Filipe Castro Mendes (40) Lêdo Ivo (33) Manoel de Barros (36) Manuel Alegre (41) Manuel António Pina (33) Manuel Bandeira (39) Manuel de Freitas (41) Marina Colasanti (38) Mario Quintana (38) Micheliny Verunschk (40) Miguel Torga (31) Murilo Mendes (32) Mário Cesariny (34) Narlan Matos (85) Nuno Júdice (32) Nuno Rocha Morais (492) Pedro Mexia (40) Poemas Sociais (30) Poèmes inédits (301) Pássaro de vidro (52) Reinaldo Ferreira (40) Ronaldo Costa Fernandes (42) Rui Knopfli (43) Rui Pires Cabral (44) Ruy Belo (28) Ruy Espinheira Filho (43) Ruy Proença (48) Sophia de Mello Breyner Andresen (32) Tesoura cega (35) Thiago de Mello (38) Ultimos Poemas (103) Vasco Graça Moura (40) Vinícius de Moraes (34)