A ponte


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A ponte
Le pont


O desenho da ponte é justo e firme, calmo e exato.
Nada poderá perturbar as suas linhas definitivas.
A sua arquitetura equilibra-se no ar
Como um navio na água, uma nuvem no espaço.
Embaixo da ponte há ondas e sombras.
Os mendigos dormem enrodilhados nos cantos.
Não têm forma humana. São sacos no chão.
Por momentos parece ouvir-se o choro de uma criança.
A água embaixo é suja,
O óleo coagula, em nódoas luminosas, reflexos lacrimejantes.
Um vulto debruçado sobre as águas
Contempla o mundo náufrago.
A tristeza cai da ponte
Como a poesia cai do céu.
O homem está embaixo aparando as migalhas do infinito.

A ponte é sombria como as prisões.
Os que andam sobre a ponte
Sentem os pés puxados para o abismo.
Ali tudo é iminente e irreparável,
Dali se vê a ameaça que paira.
A ponte é um navio ancorado.
Ali repousam os fatigados,
Ouvindo o som das águas, a queixa infindável,
Infindável, infindável...
Um apito dá gritos
A princípio crescendo em uivos, depois mantendo bem alto
[o apelo desesperado.
Passam navios. Tiros. Trovões.
Quando virá o fim do mundo ?
Por cima da ponte se cruzam
Reflexos de fogo, relâmpagos súbitos, misteriosos sinais.
Que combinam entre si os astros, inimigos da Terra ?
Quando virá o fim dos homens ?
A ponte pensa...

Le dessin d'un pont est juste et ferme, calme et précis.
Rien ne vient perturber ses lignes définitives.
Son architecture est en équilibre dans l'air
Comme un bateau dans l'eau, un nuage dans l'espace.
Dessous le pont, il y a des vagues et des ombres.
Les mendiants y dorment blottis dans les coins.
Leur forme n'est plus humaine. Rien que sacs sur le sol.
Il semble qu'on entende parfois un enfant pleurer.
L'eau est sale au-dessous,
L'huile coagule, lumineuses auréoles, reflets larmoyants.
Une silhouette se penche sur les eaux
Contemple le monde qui naufrage.
La tristesse tombe du pont
Comme la poésie tombe du ciel.
L'homme est en bas, qui découpe des miettes dans l'infini.

Le pont est plus sombre qu'un prison.
Ceux qui marchent au tablier
Sentent leurs pieds attirés vers l'abîme.
Tout est là, imminent et irréparable,
De là, on voit la menace qui pèse.
Le pont est un navire ancré.
Là reposent, ceux qui sont fatigués
S'entend l'interminable plainte, le bruit sans fin,
Sans fin des eaux...
Un sifflement aigu
Qui d'abord grandit en hurlements, puis maintient haut
[son appel désespéré.
Passent les navires. Tirs. Tonnerre.
Quand viendra-t-elle la fin du monde ?
On traverse au-dessus du pont
Reflets de feu, éclairs brusques, signaux mystérieux.
Que manigancent-ils entre eux, les astres, ennemis de la terre ?
Quand viendra-t-elle la fin des hommes ?
Le pont réfléchit.

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Claude Monet
Le pont de Waterloo, effet du soleil (1903)
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