Adão e Eva


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Adão e Eva
Adam et Ève


Olhámo-nos um dia,
E cada um de nós sonhou que achara
O par que a alma e a carne lhe pedia.

- E cada um de nós sonhou que o achara…

E entre nós dois
Se deu, depois, o caso da maçã e da serpente,
.. Se deu, e se dará continuamente:

Na palma da tua mão,
Me ofertaste, e eu mordi, o fruto do pecado.

- O meu nome é Adão…

E em que furor sagrado
Os nossos corpos nus e desejosos
Como serpentes brancas se enroscaram,
Tentando ser um só!

Ó beijos angustiados e raivosos
Que as nossas pobres bocas se atiraram
Sobre um leito de terra, cinza e pó!

Ó abraços que os braços apertaram,
Dedos que se misturaram!

Ó ansia que sofreste, ó ansia que sofri,
Sêde que nada mata, ânsia sem fim!
- Tu de entrar em mim,
Eu de entrar em ti.

Assim toda te deste,
E assim todo me dei:

Sobre o teu longo corpo agonizante,
Meu inferno celeste,
Cem vezes morri, prostrado…
Cem vezes ressuscitei
Para uma dor mais vibrante
E um prazer mais torturado.

E enquanto as nossas bocas se esmagavam,
E as doces curvas do teu corpo se ajustavam
Às curvas fortes do meu,
Os nossos olhos muito perto, imensos
No desespero desse abraço mudo,
Confessaram-se tudo!
… Enquanto nós pairávamos, suspensos
Entre a terra e o céu.

Assim as almas se entregaram,
Como os corpos se tinham entregado.
Assim duas metades se amoldaram
Ante as barbas, que tremeram,
Do velho Pai desprezado!

E assim Eva e Adão se conheceram:

Tu conheceste a força dos meus pulsos,
A miséria do meu ser,
Os recantos da minha humanidade,
A grandeza do meu amor cruel,
As veias de oiro que o meu barro trouxe…

Eu os teus nervos convulsos,
O teu poder,
A tua fragilidade,
Os sinais da tua pele,
O gosto do teusangue doce…

Depois…

Depois o quê, amor? Depois, mais nada,
- Que Jeová não sabe perdoar!

O Arcanjo entre nós dois abrira a longa espada…

Continuaremos a ser dois,
E nunca nos pudemos penetrar!
Un jour, nous nous sommes regardés
Et chacun de nous a rêvé d'avoir trouvé
La moitié que l'âme et la chair réclament.

- Et chacun de nous a rêvé qu'il l'avait trouvé...

Et puis, entre nous deux
L'histoire de la pomme et du serpent s'est reproduite,
.. S'est produite, encore et encore :

Dans la paume de ta main,
Tu me l'as offerte, et j'ai mordu, le fruit du péché.

- Je m'appelle Adam...

Et dans quelle fureur sacrée
Nos corps nus et remplis de désirs
Comme de blancs serpents se sont enroulés,
Essayant de ne plus faire qu'un !

Ô baisers angoissés et furieux
Que nos pauvres bouches se sont lancées
Sur un lit de terre, de poussières et de cendres !

Ô bras qui s'étreignent et se câlinent,
Doigts qui se mêlent et se resserrent !

Ô envie que tu souffres, ô mon envie de souffrir,
Soif que rien ne tue, désir sans fin !
- Toi d'entrer en moi,
Moi d'entrer en toi.

Je t'ai tout donné ainsi,
Et ainsi, tu me donnais tout :

Sur ton long corps angonisant,
Mon enfer céleste,
Cent fois je suis mort, prostré...
Cent fois j'ai ressuscité
Pour une douleur plus vibrante
Et un plaisir plus torturé.

Et tandis que nos bouches s'écachaient,
Et que les douces courbes de ton corps s'ajustaient
Aux fortes courbes du mien,
Nos yeux très proches, immenses, perdus
Dans le désespoir de cette étreinte muette,
Se sont tout avoués !
… Et tandis que nous étions là, suspendus
Entre terre et ciel.

Nos âmes se sont données,
Comme se sont livrés nos corps.
Ainsi deux moitiés se sont unies
À la barbe tremblante,
Du vieux Père méprisé !

Adam et Ève s'étaient rencontrés :

Tu as connu la force de mes poignets,
La misère de mon être,
Les recoins de mon humanité,
La grandeur de mon cruel amour,
Les veines d'or que mon argile recèle...

Je suis tes nerfs convulsifs,
Ton pouvoir,
Ta fragilité,
Les signes sur ta peau,
Le goût de ton doux sang…

Après…

Après, quoi, mon amour ? Après, plus rien,
- Jéhovah ne sait pas pardonner !

L’Archange a déposé entre nous deux la longue épée…

Nous avons continuer à être deux,
Mais nous n'avons jamais pu en nous pénétrer !
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Fernand Léger
Adam et Ève (1934)
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