Amor


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José Régio »»
 
As Encruzilhadas de Deus (1935) »»
 
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Amor
Amour


Rolam e desenrolam-se ondas lentas..., nuvens brancas
Boleiam curvas a capricho,
Desde as tuas espáduas
Até às tuas ancas.
Tuas coxas espraiam-se indolentes como dunas,
Incham como botões de rosa colossais,
São como serras que tu, névoa, enfunas...
Teus braços matinais,
Que alvura e que frescura!
Lembram ribeiros..., ribeirinhos de água pura;
Ribeirinhos que nascem cada um na sua colina
Dos teus ombros macios de menina,
Correm ao longo do teu corpo de mulher,
Vão desaguar num cálice de flor...;
Que tuas mãos são flores
Que apetece aspirar, colher, beijar, pisar, comer...

Que finas pétalas, ou sépalas, teus dedos esfolhados
Sobre o teu ventre, monte santo
Com seus bosques sagrados!
E os teus seios..., que búzios dá o mar,
Que pomos gera seja que pomar,
Comparáveis em forma, cor, sabor?
Um só, amor!,
Um só fruto conheço que os apouca!:
É tua boca,
Com as pevidezinhas dos teus dentes...
Quanto a fragrância,
Desata os teus cabelos sem tesouras e sem pentes,
Desata essa cascata
De oiro a correr ao sol,
Essa seda esfiando-se em reflexos de arrebol...!
Mulher, como o universo
Cabe nos seis centímetros dum verso,
Em ti, nossos sentidos,
Os conhecidos e os desconhecidos,
Sentem caber, reunida, a natureza inteira.
Nesses regatos, nessas sombras, nesses altos, nessas
 praias,
Meu corpo, quando desmaias,
Não escutes os meus gritos!
A ti, Deus ensinou-te a resolver os meus conflitos.
E a ti também, minh’alma.
Se não, mira-te bem,
Quando baixar a calma
Sobre esse arfar faminto dos seus seios,
Sobre essas ondas solevadas dos seus ombros e
 quadris,
Sobre esse corpo que é terrível quando vibra de feliz,
Mira-te bem
Nos olhos seus, sobre que vem
Caindo a tarde, a reza das trindades,
A luz do luar, que faz saudades e saudade de
 saudades,
O sorriso de vésper a acenar,
A solidão das ondas no alto mar,
O pasmo dos desertos,
A expectativa ansiosa dos espaços entreabertos...,
Compreenderás
Que em toda a terra há céu atrás!
Alma e corpo em um só, então, um Eu maior
Transponha, Deus lho ensina!,
A sínteses de amor,
Este abismo que sempre há-de permanecer
Entre estes pobres dois: eu homem, tu mulher...
Lentes des ondes roulent et se déroulent..., nuages blancs
Qui épousent tes courbes à leur guise
Depuis ta nuque
Jusqu'à tes hanches.
Tes cuisses déferlent indolemment de la dune,
Et s'arrondissent, boutons de rose colossaux,
Ce sont des monts que toi, nues, tu bombes.
Tes bras matinaux,
Quelle candeur et quelle fraîcheur !
On dirait des ruisseaux... de petits ruisseaux d'eau pure,
Ruisselets qui chacun naissent d'une colline
De tes épaules veloutées de fille,
Et coulent le long de ton corps de femme,
Et vont se déverser au calice des fleurs...,
Car tes mains sont fleurs
Que l'on voudrait sentir, cueillir, baiser, fouler, dévorer...

Quels fins pétales, ou sépales , tes doigts défeuillés
Sur ton ventre, sainte montagne
Avec ses bosquets sacrés !
Et tes seins..., y a-t-il coquillage offert par la mer,
Ou pomme produite par le verger,
Qui soit comparable en forme, couleur, saveur ?
Amour, un seul !
Je ne connais qu'un seul fruit qui les surpasse :
Ta bouche !
Avec ces petits grains de tes dents...
Quant au parfum,
Délace tes cheveux sans ciseaux ni peignes,
Délivre cette cascade
D'or courant au soleil,
Cette soie qui s'effiloche en reflets rougeoyants
Femme, pareille à l'univers
Il t'échoit de tenir dans les six centimètres d'un vers,
En toi, nos sens,
Connus et inconnus,
Croient tenir, réunie, la nature entière.
Dans ces cours d'eau, ces ombres, ces hauteurs,
 ces plages,
Mon corps, quand tu défailles,
N'écoute pas mes cris !
Dieu ne t'a-t-il pas enseigné à résoudre mes conflits.
Et à toi aussi, mon âme.
Sinon, regarde attentivement,
Quand revient le calme
Sur la houle affamé de ses seins,
Sur ces vagues ensoleillées de ses épaules et de
 ses hanches,
Sur ce corps qui est terrible lorsqu'il vibre de bonheur,
Regarde-le attentivement
Droit dans les yeux, quand sur lui
Tombe le soir, la prière des vêpres,
Le clair de lune, qui creuse le manque, et le manque
 du manque,
Le sourire vespéral qui fait hocher la tête,
La solitude des vagues en haute mer,
La contemplation des déserts,
L'anxieuse interrogation des espaces entrouverts...,
Et tu comprendras
Que toute terre est traversée d'un ciel !
Âme et corps en un seul font un Moi plus grand
Qui outrepasse, Dieu nous l'enseigne !
Cette synthèse d'amour,
Cet abîme qui toujours demeurera
Entre ces deux pauvretés : toi, moi, une femme, un homme.
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Pablo Picasso
Les amants (1932)
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