À Beleza


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Miguel Torga »»
 
Odes (1946) »»
 
Italien »»
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À Beleza
À la beauté


Não tens corpo, nem pátria, nem família,
Não te curvas ao jugo dos tiranos.
Não tens preço na terra dos humanos,
Nem o tempo te rói.
És a essência dos anos,
O que vem e o que foi.

És a carne dos deuses,
O sorriso das pedras,
E a candura do instinto.
És aquele alimento
De quem, farto de pão, anda faminto.

És a graça da vida em toda a parte,
Ou em arte,
Ou em simples verdade.
És o cravo vermelho,
Ou a moça no espelho,
Que depois de te ver se persuade.

És um verso perfeito
Que traz consigo a força do que diz.
És o jeito
Que tem, antes de mestre, o aprendiz.

És a beleza, enfim. És o teu nome.
Um milagre, uma luz, uma harmonia,
Uma linha sem traço...
Mas sem corpo, sem pátria e sem família,
Tudo repousa em paz no teu regaço.

Tu n'as pas de corps, ni de patrie, ni de famille,
Tu ne te courbes pas sous le joug des tyrans.
Tu es sans prix sur la terre des hommes,
Et le temps ne te ronge pas.
Tu es la quintessence des ans,
Ce qui vient et ce qui fut.

Tu es la chair des dieux.
Le sourire des pierres,
Et la candeur de l'instinct.
Tu es cet aliment pour celui
Qui, gavé de pain, est affamé.

Tu es la grâce de la vie en toutes choses,
Aussi bien en art
Qu'en de simples vérités.
Tu es l’œillet vermeil,
Ou la fille dans le miroir,
Qui après t'avoir vue se décide.

Tu es ce vers parfait
Qui t’apporte la force de ce qu'il dit.
Tu es cette façon
que possède l'apprenti, avant le maître.

Tu es la beauté, enfin. Tu es ton nom.
Un miracle, une lumière, une harmonie,
Une ligne sans trace ...
Mais sans corps, sans patrie et sans famille,
Tout repose en paix sur tes genoux.

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Sandro Botticelli
La naissance de Vénus (1476-1487)

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