Janelas


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Ruy Proença »»
 
Monstruário de fomes (2019) »»
 
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Janelas
Fenêtres


em novembro de 1977, indo para Campo Formoso, no sertão baiano, hospedei-me um dia
en novembre 1977, je me rendais à Campo Formoso, dans le sertão bahianais, où je passais une journée
no apartamento de uma querida amiga bailarina, Lia, na praia da Pituba, em Salvador.
dans l'appartement d'une chère amie danseuse, Lia, près de la plage de Pituba, à Salvador.
à noite, sentados no sofá, luzes da sala apagadas, olhando pela janela, ela disse:
la nuit tombée, assis sur le canapé, lumières éteintes, comme nous regardions par la fenêtre elle me dit :
“olhe aquele prédio escuro, com algumas janelas acesas, pequenos quadrados de luz.
« regarde ce bâtiment sombre, avec ces fenêtres allumées, ces petits carrés de lumière.
imagine a parede do prédio tão mais escura que se confunda com o bloco negro da noite sem lua.
imagine le mur du bâtiment tellement plus sombre qu'il se fond dans le bloc noir de la nuit sans lune.
não vê que as janelas acesas são pequenos buracos por onde passa a luz que existe
ne vois-tu pas que les fenêtres éclairées sont de petits trous par lesquels passe la lumière qui existe
do outro lado da parede do mundo?”. tempos depois, lendo Introdução à história
de l'autre côté de la paroi du monde ? ». quelque temps plus tard, comme je lisais l'Introduction à l'histoire
da filosofia, de Hegel, vejo que Anaximandro, 2.600 anos antes, teve a mesma ideia
de la philosophie de Hegel, je m'aperçus qu'Anaximandre, 2.600 ans plus tôt, avait eu la même idée
observando as estrelas. elas são furos na sólida abóbada celeste, por onde
en observant les étoiles. elles sont des perforations dans la solide voûte céleste, par lesquelles
se pode ver a luz do fogo eterno envolvendo a terra. mais tarde, em 1990, em uma oficina
nous pouvons voir la lumière du feu éternel qui enveloppe la terre. plus tard, en 1990, dans un atelier
de poesia, escrevi o poema Olhar antigo, fruto dessa experiência:
de poésie, j'écrivais le poème Olhar antigo, fruit de cette expérience :

vem a noite
indisfarçável
sem maquiagem
memória solitária
campo de girassóis do pensamento

em seu compacto escudo negro
longínquo
cada estrela
é uma escotilha
debruçada sobre a claridade
de um dia eterno
vient la nuit
non voilée
sans maquillage
solitaire souvenir
champ de tournesols de ma pensée

sous son bouclier noir compact
au plus lointain
chacune des étoiles
est une écoutille
s'inclinant sur la clarté
d'un jour éternel
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Georgia O’Keeffe
Nuit étoilée (carte postale de Noël) (1917)
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