Sono das águas


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João Guimarães Rosa »»
 
Magma (1936-1997) »»
 
Italien »»
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Sono das águas
Sommeil des eaux


Há uma hora certa,
no meio da noite, uma hora morta,
em que a água dorme. Todas as águas dormem:
no rio, no açude,
na lagoa, no brejão, nos olhos d′água,
nos grotões fundos.
E quem ficar acordado,
na barranca, a noite inteira,
há de ouvir a cachoeira
parar a queda e o choro,
que a água foi dormir...

Águas claras, barrentas, sonolentas,
todas vão cochilar.
Dormem gotas, caudais, seivas das plantas,
fios brancos, torrentes.
O orvalho sonha
nas placas da folhagem.
E adormece
até a água fervida,
nos copos de cabeceira dos agonizantes...

Mas nem todas dormem, nessa hora
de torpor líquido e inocente.
Muitos hão de estar vigiando,
e chorando, a noite toda,
porque a água dos olhos
nunca tem sono...
Il y a toujours une heure,
au milieu de la nuit, une heure morte,
où l'eau s'endort. Toutes les eaux dorment :
dans le fleuve, l'étang,
le lac, et le marais, dans les trous d'eau,
au fond des grottes.
Et celui qui reste éveillé,
dans la ravine, la nuit entière,
entendra la cascade
arrêter sa chute et ses pleurs,
lorsque l'eau va s'endormir...

Eaux claires, argileuses, somnolentes,
elles vont toutes s'assoupir.
Gouttes et flots dorment, sèves des plantes,
fils blancs, torrents.
La rosée rêve
sur les à-plats du feuillage.
Et jusqu'à l'eau
bouillie qui s'endort
dans les verres au chevet des mourants...

Mais toutes ne dorment pas en cet instant
d'une torpeur liquide et innocente.
Beaucoup doivent rester vigilantes,
et pleurer, toute la nuit,
car l'eau des yeux
n'a jamais sommeil...
________________

Jean-Baptiste Siméon Chardin
Nature morte aux prunes (1730)
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