Epístola para um cisne


Nom :
 
Recueil :
 
Autre traduction :
Fiama Hasse Pais Brandão »»
 
Epístolas e memorandos (1996) »»
 
Italien »»
«« précédent /  Sommaire / suivant »»
________________


Epístola para um cisne
Épître au cygne


Cisne, que não conheces na água o teu reflexo verde
quando sob o teu corpo é dia e o sol afaga quedo
ou quando do teu porte há a sombra negra igual
a tudo o que está negro, e é noite, e abandono e medo.
Nem concebes o amor, nem leda, nem sequer eu mesma
que te amo no poema e temo o canto imaginado
que não cantaste agora ou não ouvi, de madrugada
quando a minha mãe morta era somente insone.
Nunca viste a beleza, nem a vida e os lábios
que sopram as primeiras e últimas palavras, ou
o hálito que sai em voz da dor mais desolada.
Nem a doença, a morte e os olhos sem imagens
do ar e das cores várias viste em que tu vogas branco.
É falso que celebres sozinho a tua morte e o fim,
se não sabes que só o teu outro cisne se perde.
Mas quando vi insone e logo morta a minha mãe
estou certa de que a cega, a muda, falsa ave cantou.

Cygne, toi qui ne connais pas dans l'eau ton reflet vert
quand le jour est sous ton corps et le soleil caresse vague
ou quand dans ta silhouette il y a une ombre noire égale
et tout ce qui est noir, c'est la nuit, et l'abandon et la peur.
Toi qui ne conçoit l'amour, ni Léda, ni moi-même qui
néanmoins t'aime en cette poésie et crains le chant imaginé
que tu n'as pas encore chanté ni moi, entendu, ce matin
quand ma mère morte était seulement insomnieuse.
Jamais tu n'as vu la beauté, ni la vie et les lèvres
qui soufflent les premières et les dernières paroles, ou
l'haleine qui sort sans la voix de la douleur la plus désolée.
Ni la maladie, la mort et les yeux sans images, de l'air et
des diverses couleurs vues en lesquelles tu voguais, blanc.
Il est faux de dire que tu célèbres seul ta mort et la fin,
si tu ne sais pas que seul ton autre cygne se perd.
Mais lorsque j'ai vu ma mère insomnieuse et bientôt morte,
j'étais certaine que l'oiseau chantait aveugle, et faux et muet.

________________

Jan Asselijn
Cygne menacé (1650)
...

Aucun commentaire:

Enregistrer un commentaire

Nuage des auteurs (et quelques oeuvres)

A. M. Pires Cabral (44) Adélia Prado (40) Adolfo Casais Monteiro (36) Adriane Garcia (40) Affonso Romano de Sant'Anna (41) Al Berto (38) Albano Martins (41) Alexandre O'Neill (29) Ana Cristina Cesar (38) Ana Elisa Ribeiro (40) Ana Hatherly (43) Ana Luísa Amaral (40) Ana Martins Marques (48) Antônio Cícero (40) António Gedeão (37) António Ramos Rosa (39) Augusto dos Anjos (50) Caio Fernando Abreu (40) Carlos Drummond de Andrade (43) Carlos Machado (104) Casimiro de Brito (40) Cecília Meireles (37) Conceição Evaristo (33) Daniel Faria (40) Dante Milano (33) David Mourão-Ferreira (40) Donizete Galvão (41) Eugénio de Andrade (34) Ferreira Gullar (39) Fiama Hasse Pais Brandão (38) Francisco Carvalho (40) Galeria (27) Gastão Cruz (40) Gilberto Nable (46) Hilda Hilst (41) Inês Lourenço (40) João Cabral de Melo Neto (43) João Guimarães Rosa (33) João Luís Barreto Guimarães (40) Jorge de Sena (40) Jorge Sousa Braga (40) José Eduardo Degrazia (40) José Gomes Ferreira (40) José Saramago (40) Lêdo Ivo (33) Luis Filipe Castro Mendes (40) Manoel de Barros (36) Manuel Alegre (41) Manuel António Pina (32) Manuel Bandeira (39) Manuel de Freitas (41) Marina Colasanti (38) Mário Cesariny (34) Mario Quintana (38) Miguel Torga (31) Murilo Mendes (32) Narlan Matos (85) Nuno Júdice (32) Nuno Rocha Morais (432) Pássaro de vidro (52) Poemas Sociais (30) Poèmes inédits (250) Reinaldo Ferreira (9) Ronaldo Costa Fernandes (42) Rui Pires Cabral (44) Ruy Belo (28) Ruy Espinheira Filho (43) Ruy Proença (41) Sophia de Mello Breyner Andresen (32) Tesoura cega (35) Thiago de Mello (38) Ultimos Poemas (103) Vasco Graça Moura (40) Vinícius de Moraes (34)