Até casa, o caminho é uma serpente...


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Até casa, o caminho é uma serpente...
Jusqu'à la maison, le chemin est un serpent...


Até casa, o caminho é uma serpente
Que se alimenta da sua própria substância.
Até lá, é preciso atravessar a fantasmagoria
Dos bastiões e casamatas, fitando com olhos de coruja
Os focos de luz azulada que lhes estão apontados;
É preciso encontrar o espectro que acende o cigarro,
Pigarreia, pede uma indicação e se desvanece,
Os esqueletos de metal dos guindastes,
Como mastodontes num museu de história natural;
É preciso ver cruzar, na distância,
As luzes penadas, desencarnadas, de um comboio,
Ver as chispas torturadas que as suas rodas
Arrancam aos carris;
É preciso sentir a respiração ofegante,
Moribunda, das árvores sob a primeira neve,
Farejando o fim em curso, que as retomará,
Mudado já em princípio iminente;
É preciso ouvir o rumorejar da corrente,
A água que se repete e repete na noite,
Quando os rios da terra são também
Os rios do céu; é preciso ouvir essa água,
O sinal do regresso sem fundo falso,
E então sei que estou em casa.

Jusqu'à la maison, le chemin est un serpent
Qui se nourrit de sa propre substance.
En attendant, il faut traverser la fantasmagorie
Des bastions et des casemates, fixant d'un regard de hibou
Les foyers de lumière bleutée qui les visent ;
Il faut croiser le spectre qui allume sa cigarette,
Se racle la gorge, interroge et disparait,
Les squelettes métalliques des grues, comme
Des mastodontes dans un musée d'histoire naturelle ;
Il faut voir, au loin, traverser avec peine
Les lumières désincarnées d'un train,
Voir les flammèches torturées que ses roues
Arrachent aux rails ;
Il faut sentir la respiration haletante,
Moribonde, des arbres sous la première neige,
Flairant la fin en cours, qui va les reprendre,
Changée déjà, en un départ imminent ;
Il faut entendre le courant qui gronde,
L'eau qui se répète et se répète dans la nuit,
Quand les fleuves de la terre sont aussi
Les fleuves du ciel ; il faut entendre cette eau,
Le signal du retour sans double-fond,
Et je sais alors que je suis chez moi.

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Alfred Sisley
La neige à Louveciennes (1878)
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