Poema dialético


Nom :
 
Recueil :
 
Autre traduction :
Murilo Mendes »»
 
Janela do caos (1949) »»
 
Italien »»
«« précédent / Sommaire / suivant »»
________________


Poema dialético
Poème dialectique


I
Todas as coisas ainda se encontram em esboço
Tudo vive em transformação
Mas o universo marcha
Para a arquitetura perfeita.

Retiremos das árvores profanas
A vasta lira antiga.
Sua secreta música
Pertence ao ouvido e ao coração de todos.
Cada novo poeta que nasce
Acrescenta-lhe uma corda.

II
Uma vida iniciada há mil anos atrás
Pode ter seu complemento e plenitude
Numa outra vida que floresce agora.

Nada poderá se interromper
Sem quebrar a unidade.

Um germe foi criado no princípio
Para que se desdobre em plenos múltiplos.
Nossos suspiros, nossos anseios, nossas dores
São gravados no campo do infinito
Pelo espírito sereníssimo que preside às gerações.

III
A muitos só lhes resta o inferno.
Que lhes coube na monstruosa partilha da vida
Senão um desespero sem nobreza, e a peste da alma?
Nunca ouviram a música nascer do farfalhar
  das árvores,
Nem assistiram à contínua anunciação
E ao contínuo parto das belas formas.
Nunca puderam ver a noite chegar sem elementos
  de terror.
Caminham conduzindo o castigo e a sombra de seus atos.
Comeram o pó e beberam o próprio suor.
Não se banharam no regato livre...

Entretanto, a transfiguração precede a morte.
Cada um deve realiza-la na sua carne e no seu espírito
Para que a alegria seja completa e definitiva.

IV
É necessário conhecer seu próprio abismo
E polir incessantemente o candelabro que o esclarece.

Tudo no universo marcha, e marcha para esperar:
Nossa existência é uma vasta expectação
Onde se tocam o princípio e o fim.
A terra terá que ser retalhada entre todos
E restituída um dia à sua antiga harmonia.
Tudo marcha para a arquitetura perfeita.
A aurora é coletiva.

I
Toutes les choses ne sont encore qu'une ébauche
Tout est vivant et se transforme
Mais l'univers est en marche
Vers une architecture parfaite.

Nous extrayons des arbres profanes
La grande lyre antique.
Sa musique secrète
Appartient à l'oreille et au cœur de tous.
Chaque nouveau poète en naissant
Lui ajoute une corde.

II
Une vie qui a commencé il y a mille ans
Peut avoir son complément et sa plénitude
Dans une autre vie qui fleurit maintenant.

Rien ne peut s'interrompre
Sans briser l'unité.

Un germe fut créé à l'origine
Pour que se déploie sa multiplicité parfaite.
Nos soupirs, nos désirs, nos douleurs
Sont gravés sur les tables de l'infini
Par l'esprit le plus serein qui préside aux générations.

III
Pour beaucoup il ne reste que l'enfer.
Que leur revient-il du monstrueux partage de la vie
Si ce n'est un désespoir sans noblesse, et la peste de l'âme ?
Jamais ils n'entendent la musique, née du frouement
  des arbres,
Ni n'assiste à la continuelle annonciation
À cette naissance continue des belles formes.
Jamais ils ne pourront voir venir la nuit sans éléments
  de terreur.
Ils vont tout droit au châtiment à l'ombre de leurs actes.
Ils ont mangé la poussière et bu leur propre sueur.
Ne se sont pas baignés dans l'eau vive du ruisseau ...

Cependant, la transfiguration précède la mort.
Chacun doit la réaliser dans sa chair et son esprit.
Pour que la joie soit complète et définitive.

IV
Il est nécessaire de connaître son propre abîme
Et de polir sans cesse le chandelier qui l’éclaire.

Tout dans l'univers est en marche, en marche et espère :
Notre existence est une grande espérance.
Où l'origine et la fin se touchent.
La terre devra être répartie entre tous
Et restituée un jour, à son antique harmonie.
Tout est en marche vers une architecture parfaite.
L'aube est collective.

________________

Apollon avec sa lyre
Pompei, Villa de Moregine (I sec. après J.C.)

Aucun commentaire:

Enregistrer un commentaire

Nuage des auteurs (et quelques oeuvres)

A. M. Pires Cabral (44) Adélia Prado (40) Adolfo Casais Monteiro (36) Adriane Garcia (40) Affonso Romano de Sant'Anna (41) Al Berto (38) Albano Martins (41) Alexandre O'Neill (29) Ana Cristina Cesar (38) Ana Elisa Ribeiro (40) Ana Hatherly (43) Ana Luísa Amaral (40) Ana Martins Marques (48) Antônio Cícero (40) António Gedeão (37) António Ramos Rosa (39) Augusto dos Anjos (50) Caio Fernando Abreu (40) Carlos Drummond de Andrade (43) Carlos Machado (104) Casimiro de Brito (40) Cecília Meireles (37) Conceição Evaristo (33) Daniel Faria (40) Dante Milano (33) David Mourão-Ferreira (40) Donizete Galvão (41) Eugénio de Andrade (34) Ferreira Gullar (39) Fiama Hasse Pais Brandão (38) Francisco Carvalho (40) Galeria (27) Gastão Cruz (40) Gilberto Nable (46) Hilda Hilst (41) Inês Lourenço (40) João Cabral de Melo Neto (43) João Guimarães Rosa (33) João Luís Barreto Guimarães (40) Jorge de Sena (40) Jorge Sousa Braga (40) José Eduardo Degrazia (40) José Gomes Ferreira (40) José Saramago (40) Lêdo Ivo (33) Luis Filipe Castro Mendes (40) Manoel de Barros (36) Manuel Alegre (41) Manuel António Pina (32) Manuel Bandeira (39) Manuel de Freitas (41) Marina Colasanti (38) Mário Cesariny (34) Mario Quintana (38) Miguel Torga (31) Murilo Mendes (32) Narlan Matos (85) Nuno Júdice (32) Nuno Rocha Morais (432) Pássaro de vidro (52) Poemas Sociais (30) Poèmes inédits (250) Reinaldo Ferreira (4) Ronaldo Costa Fernandes (42) Rui Pires Cabral (44) Ruy Belo (28) Ruy Espinheira Filho (43) Ruy Proença (41) Sophia de Mello Breyner Andresen (32) Tesoura cega (35) Thiago de Mello (38) Ultimos Poemas (103) Vasco Graça Moura (40) Vinícius de Moraes (34)