Caranguejo


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João Guimarães Rosa »»
 
Magma (1936-1997) »»
 
Italien »»
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Caranguejo
Crabe


Caranguejo feiíssimo,
monstruoso,
que te arrastas na areia
como a miniatura
de um tanque de guerra...
Gosto de ti, caranguejo,
Câncer meu padrinho
nas folhinhas,
pois nasci sob as bênçãos do teu signo
zodiacal...

Teu par de puãs cirúrgicas oscila
à frente do escudo lamaçento
de velho hoplita.
E mais oito patas, peludas,
serrilhadas,
de crustáceo nobre,
retombam no mole desengonço
de pés e braços muito usados,
desarticulados,
de um bebê de celulóide.

Caranguejo sujo,
desconforme,
como um atarracado Buda roxo
ou um ídolo asteca...

És forte e ao menor risco te escondes
na carapaça bronca,
como fazem os seres evoluídos,
misantropos, retraídos,
o filósofo, o asceta,
o cágado, o ouriço, o caracol...

Caranguejo hediondo,
de armadura espessa,
prudente desertor...
Para as luas do amor, quero aprender contigo,
quero fazer como fazes, animalejo frio,
que, tão calcariamente encouraçado,
só sabes recuar...
Crabe horriblement laid,
monstrueux,
qui te traînes sur le sable
comme un char
de combat miniature...
Je t'apprécie, crabe,
cancer mon parrain
dans les journaux,
car je suis né sous les auspices de ton signe
zodiacal...

Ta paire de ciseaux chirurgicale oscille
devant le bouclier fangeux
du vieil hoplite.
Et tes huit autres pattes, poilues,
crantées,
de noble crustacé,
retombent en le mol amoncellement
de pieds et de bras usagés,
désarticulés,
d'un bébé en celluloïd.

crabe dégoûtant,
disproportionné,
comme un trapu bouddha violet
ou une idole aztèque...

Tu es fort et au moindre incident tu te caches
dans ta carapace grossière,
comme le font les êtres évolués,
misanthropes et retraits,
le philosophe, l'ascète,
la tortue, le hérisson, l'escargot...

crabe répugnant,
au blindage épais,
déserteur prudent...
Pour les lunes d'amour, je veux apprendre de toi,
je veux agir comme toi, froid bestion,
qui, tant cuirassé de calcaire,
et seul, sais reculer...
________________

Vincent van Gogh
Les deux crabes (1889)
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