O quarto


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Manuel António Pina »»
 
Como se desenha uma casa (2011) »»
 
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O quarto
La chambre


Quem te pôs a mão no ombro,
a faca que te atravessou o coração,
são feridas alheias, talvez algo que leste;
entretanto partiste

para lugares menos iluminados
e corações menos vulneráveis,
pode perguntar-se é o que fazes ainda aqui
se já cá não estás.

A hora havia de chegar em que
nos perderíamos um do outro.
E acabaríamos necessariamente assim,
mortos inventariando mortos.

Morrer, porém, não é fácil,
ficam sombras nem sequer as nossas,
e a nossa voz fala-nos
numa língua estrangeira.

Apaga a luz e vira-te para o outro lado
e acorda amanhã como novo,
barba impecavelmente feita,
o dia um sonho sólido onde a noite se limpa e se deita.

Qui a mis sa main sur ton épaule,
et ce couteau qui traversa ton cœur,
ce sont blessures étrangères, choses que tu lisais
peut-être ; entre-temps tu es parti

vers des lieux moins éclairés
et des cœurs moins vulnérables,
on peut se demander ce que tu fais encore ici
si désormais tu n'es plus là.

Doit-elle venir, l'heure où l'un
et l'autre, nous devrions nous perdre.
Et nous finirons nécessairement ainsi,
morts inventoriant les morts.

Mourir, cependant, n'est pas facile,
il ne reste pas même une ombre des nôtres,
et notre voix nous parle
dans une langue étrangère.

Éteins la lumière et tourne-toi de l'autre côté.
Tu te réveilleras demain comme un sou neuf,
barbe impeccablement rasée,
au jour d'un rêve solide où la nuit est limpide et se couche.

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Fabio Viale
Souvenir David, 2020
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