Cantiga para ninar insones


Nom :
 
Recueil :
 
Autre traduction :
Caio Fernando Abreu »»
 
Poesias nunca publicadas de... (2012) - Década de 80 »»
 
Italien »»
«« précédent /  Sommaire / suivant »»
________________


Cantiga para ninar insones
Berceuse pour insomniaques


Quieta, carência minha:
não pinceles assim, em ouro,
o que no barro é feito. Não
desvendes metáforas complexas
onde o verbo é quase sempre raso
e pouco. Não, não te atices
assim, toda a fim, outra vez,
de elaborar torturas acetinadas
sobre mesquinharias de algodão.

Não te bastou, então, toda essa estrada?

Quieta, quieta: silencia.
Como as tevês antigas, disciplinada,
procura ver em preto, em branco,
em calmaria. Não assim, despudorada,
policrômica, out-dooresca. Respira,
respira fundo, conta até dez.
Não telefona. Não fantasia.

Sossega. Chega de enganos.

Recolhe ardores indiscriminados,
os arrebatamentos, controla.
Controla-te, por favor, carência minha,
pois urge sublimar a ânsia do sublime.
Tenta, tenta. Ou toma um mogadom,
um valium, trinta miligramas (e três,
se for preciso). E dorme, dorme
bruta, dorme profundamente, dorme
sem sonho algum
enquanto chove dentro e fora a chuva fria.

Amanhã tem mais.
Ma douleur, tiens-toi tranquille :
ne peins pas avec de l'or
ce qui est fait d'argile.
Ne convoques pas de métaphores complexes
où le verbe est presque toujours peu
de choses. Non, ne tisonne pas ainsi
le feu, encore et encore,
afin d'élaborer des tortures
de satin sur la mesquinerie de la ouate.
 
Cette route suivie ne te suffisait-elle pas ?
 
Tiens toi tranquille et fais silence.
Avec la discipline d'une vieille télé,
essaie de voir en noir et en blanc,
dans le calme. Et non comme tu le fais, sans vergogne,
polychrome, et hors-sol. Respire,
respire profondément, compte jusqu'à dix.
Ne téléphone pas. Ne fantasme pas.
 
Reste tranquille. Plus de faux-semblants.
 
Recueille tes ardeurs sans distinction,
Contrôle tes ravissements.
Contrôle-toi, s'il te plaît, ô ma douleur,
car elle doit être sublimée la passion du sublime.
Essaie, essaie. Ou prend un mogadon,
un valium, trente milligrammes (et trois,
si nécessaire). Et endors-toi, tombe
abrupt dans un sommeil profond, dors
sans aucun rêve
tandis qu'au dehors et au dedans une pluie froide se déverse.
 
Demain est un autre jour.
________________

Bruno Munari
Negatif-positif (1991)
...

Aucun commentaire:

Enregistrer un commentaire

Nuage des auteurs (et quelques oeuvres)

A. M. Pires Cabral (44) Adélia Prado (40) Adolfo Casais Monteiro (36) Adriane Garcia (40) Affonso Romano de Sant'Anna (41) Al Berto (38) Albano Martins (41) Alexandre O'Neill (29) Ana Cristina Cesar (38) Ana Elisa Ribeiro (40) Ana Hatherly (43) Ana Luísa Amaral (40) Ana Martins Marques (48) Antônio Cícero (40) António Gedeão (37) António Ramos Rosa (39) Augusto dos Anjos (50) Caio Fernando Abreu (40) Carlos Drummond de Andrade (43) Carlos Machado (106) Casimiro de Brito (40) Cecília Meireles (37) Conceição Evaristo (33) Daniel Faria (40) Dante Milano (33) David Mourão-Ferreira (40) Donizete Galvão (41) Eugénio de Andrade (34) Ferreira Gullar (39) Fiama Hasse Pais Brandão (38) Francisco Carvalho (40) Galeria (27) Gastão Cruz (40) Gilberto Nable (46) Hilda Hilst (41) Inês Lourenço (40) João Cabral de Melo Neto (43) João Guimarães Rosa (33) João Luís Barreto Guimarães (40) Jorge de Sena (40) Jorge Sousa Braga (40) José Eduardo Degrazia (40) José Gomes Ferreira (40) José Saramago (40) Lêdo Ivo (33) Luis Filipe Castro Mendes (40) Manoel de Barros (36) Manuel Alegre (41) Manuel António Pina (32) Manuel Bandeira (39) Manuel de Freitas (41) Marina Colasanti (38) Mário Cesariny (34) Mario Quintana (38) Miguel Torga (31) Murilo Mendes (32) Narlan Matos (85) Nuno Júdice (32) Nuno Rocha Morais (435) Pássaro de vidro (52) Poemas Sociais (30) Poèmes inédits (252) Reinaldo Ferreira (23) Ronaldo Costa Fernandes (42) Rui Pires Cabral (44) Ruy Belo (28) Ruy Espinheira Filho (43) Ruy Proença (41) Sophia de Mello Breyner Andresen (32) Tesoura cega (35) Thiago de Mello (38) Ultimos Poemas (103) Vasco Graça Moura (40) Vinícius de Moraes (34)