Cemitério marinho


Nom :
 
Recueil :
 
Autre traduction :
Vinícius de Moraes »»
 
Poemas esparsos (2008, póstumo) »»
 
Italien »»
«« précédent / Sommaire / suivant »»
________________


Cemitério marinho
Cimetière marin


Tal como anjos em decúbito 
A conversar com o céu baixinho 
Existem cerca de cem túmulos 
Num lindo cemiteriozinho 
Que eu, a passeio, descobri 
Um dia em Sidi Bou Said. 

Mal defendidos por uns muros 
Erguidos ao sabor da morte 
Eu nunca vi mortos tão puros 
Mortos assim com tanta sorte 
As lajes de cal como túnicas 
Brancas, e árabes; não púnicas. 

Sim, porque cemiteriozinho 
Nunca se viu assim tão árabe 
Feito o beduíno que é sozinho 
Ante o deserto que lhe cabe 
E mudo em face do horizonte 
Sem uma sombra que o confronte. 

Pequenos paralelepípedos 
Fendidos uns, conforme o sexo 
Eis suas lápides: antípodas 
Das que se vêem num cemitério 
De gente do nosso pigmento: 
Os nossos mortos de cimento. 

Quem se deixar de tarde ali 
Isento de mágoa ou conflito 
A olhar o mar (sem Valéry!) 
Como um espelho de infinito 
E o céu como um anti-recôncavo: 
Como o convexo de um côncavo 

Acabará (comigo deu-se!) 
Ouvindo os mortos cochicharem 
Alegremente, eles e Deus 
Mas não o nosso: o Deus dos árabes 
Que não fez Sidi Bou Said 
Para os prazeres de André Gide 

Mas sim porque a vida segue 
E o tempo pára, e a morte é um canto 
Porque morrer é coisa alegre 
Para quem vive e sofre tanto 
Como no cemiteriozinho, ali 
Ao céu de Sidi Bou Said. 

Pareil à des anges en décubitus
Conversant à voix basse avec le ciel
Il existe une centaine de tombes
Dans un joli petit cimetière
Que je découvrais, en promenade
Un jour à Sidi Bou Said.

À peine défendu par des murs
Érigés au gré de la mort,
jamais je ne vis morts aussi purs,
aussi chanceux d'être mort, ayant
des dalles de chaux, pour tuniques
Blanches, arabes ; et non puniques.

Oui, car personne ne vit jamais
petit cimetière plus arabe
faire le bédouin qui est seul
devant le désert qui lui échoit
et muet face à l'horizon
sans le réconfort d'une ombre.

De petits parallélépipèdes
Les uns fendus, selon le sexe
Voici leurs tombes : aux antipodes
De celles vues au cimetière
Des gens de notre pigment:
Nos morts au lait de ciment.

Et qui le soir restent là
Exempt de peine et de conflit
À regarder la mer (sans Valéry !)
Comme un miroir de l'infini
Et le ciel, comme une anti-concavité :
Comme le convexe d'un concave.

On finira par entendre (avec moi,
C'est fait !) les morts chuchoter
Joyeusement, eux et Dieu
Mais pas le nôtre : le Dieu des arabes
qui n'ont pas fait Sidi Bou Said
Pour les plaisirs d'André Gide

Mais parce que la vie continue et
Que le temps s'arrête. La mort est un chant
Parce que mourir est chose heureuse
Pour ceux qui vivent et souffrent tant
Comme dans ce petit cimetière, ici
Sous le ciel de Sidi Bou Said.

________________

Frederick Stibbert
Cimetière arabe (1875)
...

Aucun commentaire:

Enregistrer un commentaire

Nuage des auteurs (et quelques oeuvres)

A. M. Pires Cabral (44) Adélia Prado (40) Adolfo Casais Monteiro (36) Adriane Garcia (40) Affonso Romano de Sant'Anna (41) Al Berto (38) Albano Martins (41) Alexandre O'Neill (29) Ana Cristina Cesar (38) Ana Elisa Ribeiro (40) Ana Hatherly (43) Ana Luísa Amaral (40) Ana Martins Marques (48) Antônio Cícero (40) António Gedeão (37) António Ramos Rosa (39) Augusto dos Anjos (50) Caio Fernando Abreu (40) Carlos Drummond de Andrade (43) Carlos Machado (104) Casimiro de Brito (40) Cecília Meireles (37) Conceição Evaristo (33) Daniel Faria (40) Dante Milano (33) David Mourão-Ferreira (40) Donizete Galvão (41) Eugénio de Andrade (34) Ferreira Gullar (39) Fiama Hasse Pais Brandão (38) Francisco Carvalho (40) Galeria (27) Gastão Cruz (40) Gilberto Nable (46) Hilda Hilst (41) Inês Lourenço (40) João Cabral de Melo Neto (43) João Guimarães Rosa (33) João Luís Barreto Guimarães (40) Jorge de Sena (40) Jorge Sousa Braga (40) José Eduardo Degrazia (40) José Gomes Ferreira (40) José Saramago (40) Lêdo Ivo (33) Luis Filipe Castro Mendes (40) Manoel de Barros (36) Manuel Alegre (41) Manuel António Pina (32) Manuel Bandeira (39) Manuel de Freitas (41) Marina Colasanti (38) Mário Cesariny (34) Mario Quintana (38) Miguel Torga (31) Murilo Mendes (32) Narlan Matos (85) Nuno Júdice (32) Nuno Rocha Morais (432) Pássaro de vidro (52) Poemas Sociais (30) Poèmes inédits (250) Reinaldo Ferreira (9) Ronaldo Costa Fernandes (42) Rui Pires Cabral (44) Ruy Belo (28) Ruy Espinheira Filho (43) Ruy Proença (41) Sophia de Mello Breyner Andresen (32) Tesoura cega (35) Thiago de Mello (38) Ultimos Poemas (103) Vasco Graça Moura (40) Vinícius de Moraes (34)