Há-de flutuar uma cidade...


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Há-de flutuar uma cidade...
Il devrait y avoir une ville flottant...


Há-de flutuar uma cidade no crepúsculo da vida
pensava eu... como seriam felizes as mulheres
à beira mar debruçadas para a luz caiada
remendando o pano das velas espiando o mar
e a longitude do amor embarcado

por vezes
uma gaivota pousava nas águas
outra era o sol que cegava
e um dardo de sangue alastrava pelo linho da noite
os dias lentíssimos... sem ninguém

e nunca me disseram o nome daquele oceano
esperei sentada à porta... dantes escrevia cartas
punha-me a olhar a risca de mar ao fundo da rua
assim envelheci... acreditando que algum homem
ao passar
se espantasse com a minha solidão

(anos mais tarde, recordo agora, cresceu-me
uma pérola no coração. Mas estou só, muito só,
não tenho a quem deixar.)

um dia houve
que nunca mais avistei cidades crepusculares
e os barcos deixaram de fazer escala à minha porta
inclino-me de novo para o pano deste século
recomeço a bordar ou a dormir
tanto faz
sempre tive dúvidas que alguma vez me visite a felicidade

Il devrait y avoir une ville flottant au crépuscule de la vie
pensais-je... Combien alors seraient heureuses les femmes
en bord de mer penchées vers la lumière chaulée
rapiéçant le plan des voiles espionnant la mer
et la longitude de leur amour embarqué

parfois
une mouette se posait sur les eaux
le soleil en aveuglait une autre
Et un dard de sang se répandait sur le linge de la nuit
très lentement sur les jours... sans personne

Et jamais l'on m'a dit le nom de cet océan
J'attendais assis à la porte... Autrefois j'ai écrit des lettres
J'ai posé mon regard sur un trait de mer au bout de la rue
et ainsi j'ai vieilli... en croyant que certains hommes,
quelqu'un en passant
s'étonneraient de ma solitude

(Des années plus tard, dans mon cœur, le souvenir
est revenu, une perle a grandi. Mais je suis seul, très seul,
Je n'ai personne à quitter.)

il y eut un jour
où je ne revis plus jamais les villes crépusculaires
Et les bateaux ont cessé de faire escale à ma porte
De nouveau je m'incline sur le plan de ce siècle
Je recommence à broder ou à dormir
peu importe
toujours j'ai douté que le bonheur viendrait me visiter

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Eda Akaltun - Bauci (1972)
Illustration pour "Les Villes Invisibles" de Italo Calvino
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