Morte sob o sol


Nom :
 
Recueil :
 
Autre traduction :
Marina Colasanti »»
 
Rota de colisão (1993) »»
 
Italien »»
«« précédent /  Sommaire / suivant »»
________________


Morte sob o sol
Mort sous le soleil


Quando se abate uma casa
não se crava o machado de um só golpe
bem junto da raiz.
Nem é de pé que ela cai
com suas ramagens.
Uma casa
se mata devagar.

Extirpa-se primerio o corrimão da escada
abrindo para a queda os inúteis degraus.
Retiram-se as ferragens
as madeiras internas.
Depois se arrancam portas e janelas
vazam-se na fachada os alizares cegos.
E quem passa já sabe.
Aquí não mais se mora.
Só então é a vez das telhas
esfoladas sem sangue uma por uma.

Ossos à mostra
jaz
mais que morto
o descarnado esqueleto
no jardim.
Crua laparotomia dos meus fantasmas
a casa em que vivi é posta abaixo.
Vão-se os espectros todos sem abrigo
desfazendo as imágenes superpostas.
Vão nossos sons gravados na poeira.
E as palavras
palavras tantas que fiamos juntos
e que as paredes guardam entranhadas
são desfeitas a golpes de marreta.
Quand on démolit une maison
on n'enfonce pas la hache d'un seul coup
bien à fond dans la racine.
Et ce n'est pas debout qu'elle tombe
avec ses branches.
une maison se tue lentement.

On extirpe en premier, la rampe de l'escalier
ouvrant pour la chute les marches inutiles.
On retire les ferrures
les boiseries internes.
Puis sont arrachées portes et fenêtres
On vide la façade de ses chambranles aveugles.
Et déjà celui qui passent par là le sait.
Il n'y a plus de vie à cet endroit.
Après seulement vient le tour des tuiles
écorchés sans effusion de sang, une à une.

S'exposent les os,
gît
plus que mort
un squelette décharné
dans le jardin.
Cruelle laparotomie de mes fantômes
La maison où je vivais est mise à bas.
Sans abri s'en vont tous les spectres
défaisant des images qui se superposent
Disparus, nos sons gravés dans la poussière.
Et les mots
Tous les mots que nous avions tissés
ensemble et que les murs gardent enracinés,
sont démolis à coups de masse.
________________

Paul Cezanne
La Maison au mur lézardé (1892-1894)
...

Aucun commentaire:

Enregistrer un commentaire

Nuage des auteurs (et quelques oeuvres)

A. M. Pires Cabral (44) Adélia Prado (40) Adolfo Casais Monteiro (36) Adriane Garcia (40) Affonso Romano de Sant'Anna (41) Al Berto (38) Albano Martins (41) Alexandre O'Neill (29) Ana Cristina Cesar (38) Ana Elisa Ribeiro (40) Ana Hatherly (43) Ana Luísa Amaral (40) Ana Martins Marques (48) Antônio Cícero (40) António Gedeão (37) António Ramos Rosa (39) Augusto dos Anjos (50) Caio Fernando Abreu (40) Carlos Drummond de Andrade (43) Carlos Machado (106) Casimiro de Brito (40) Cecília Meireles (37) Conceição Evaristo (33) Daniel Faria (40) Dante Milano (33) David Mourão-Ferreira (40) Donizete Galvão (41) Eugénio de Andrade (34) Ferreira Gullar (39) Fiama Hasse Pais Brandão (38) Francisco Carvalho (40) Galeria (27) Gastão Cruz (40) Gilberto Nable (46) Hilda Hilst (41) Inês Lourenço (40) João Cabral de Melo Neto (43) João Guimarães Rosa (33) João Luís Barreto Guimarães (40) Jorge de Sena (40) Jorge Sousa Braga (40) José Eduardo Degrazia (40) José Gomes Ferreira (40) José Saramago (40) Lêdo Ivo (33) Luis Filipe Castro Mendes (40) Manoel de Barros (36) Manuel Alegre (41) Manuel António Pina (32) Manuel Bandeira (39) Manuel de Freitas (41) Marina Colasanti (38) Mário Cesariny (34) Mario Quintana (38) Miguel Torga (31) Murilo Mendes (32) Narlan Matos (85) Nuno Júdice (32) Nuno Rocha Morais (434) Pássaro de vidro (52) Poemas Sociais (30) Poèmes inédits (251) Reinaldo Ferreira (19) Ronaldo Costa Fernandes (42) Rui Pires Cabral (44) Ruy Belo (28) Ruy Espinheira Filho (43) Ruy Proença (41) Sophia de Mello Breyner Andresen (32) Tesoura cega (35) Thiago de Mello (38) Ultimos Poemas (103) Vasco Graça Moura (40) Vinícius de Moraes (34)