Autorretrato falado


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Manoel de Barros »»
 
O Livro das Ignorãças (1993) »»
 
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Autorretrato falado
Autoportrait parlé


Venho de um Cuiabá garimpo e de ruelas entortadas.
Meu pai teve uma venda de bananas no Beco da
Marinha, onde nasci.
Me criei no Pantanal de Corumbá, entre bichos do
chão, pessoas humildes, aves, árvores e rios.
Aprecio viver em lugares decadentes por gosto de
estar entre pedras e lagartos.
Fazer o desprezível ser prezado é coisa que me apraz.
Já publiquei 10 livros de poesia; ao publicá-los me
sinto como que desonrado e fujo para o
Pantanal onde sou abençoado a garças.
Me procurei a vida inteira e não me achei — pelo
que fui salvo.
Descobri que todos os caminhos levam à ignorância.
Não fui para a sarjeta porque herdei uma fazenda de
gado. Os bois me recriam.
Agora eu sou tão ocaso!
Estou na categoria de sofrer do moral, porque só
faço coisas inúteis.
No meu morrer tem uma dor de árvore.

Je viens de Cuiabá, ville minière aux ruelles tortueuses.
Mon père avait une échoppe de bananes à Beco da
Marinha, où je suis né.
J'ai grandi dans le Pantanal de Corumbá, entre les animaux
des champs, les humbles paysans, oiseaux, arbres et rivières.
J'aime à vivre en des lieux décadents pour le plaisir
d'être au milieu des rocailles et des lézards.
Donner de l'estime au méprisable est chose que j'apprécie.
J'ai publié déjà 10 recueils de poèmes ; de les avoir publier
je me sens déshonoré et je m'enfuis vers le
Pantanal où j'ai la bénédiction des hérons.
Je me suis cherché la vie entière sans me trouver - c'est
pourquoi je suis sauf.
J'ai découvert que tous les chemins mènent à l'ignorance.
Je ne suis pas tombé dans le caniveau car j'ai hérité
d'une ferme d'élevage. Les bœufs m'ont réinventé.
Maintenant, je suis sur le déclin !
Et je tombe dans la catégorie de la souffrance morale, car
je ne fais que des choses inutiles.
Il y a dans ma mort, une douleur d'arbre.

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Martha Barros
Do meu quintal (De mon jardin) (2014)
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