chorinho n.5


Nom :
 
Recueil :
 
Autre traduction :
Narlan Matos »»
 
Narciso Selvagem (2022) »»
 
Italien »»
«« précédent /  Sommaire / suivant »»
________________


chorinho n.5
chorinho n.5


ah, Itaquara sombra
Itaquara sol
 
bananas apodrecendo ao sol nas quitandas
velhos de olhos profundos nas janelas
somente os relógios de pêndulo falavam do tempo
 
havia crianças nas ruas cantando cirandas
“Três, três, passará
derradeiro há de ficar
bom vaqueiro, bom vaqueiro.”
 
Itaquara terra
Itaquara vento...
 
...e numa tarde tão rara
eu empinava papagaios de papel
e o vento era tão forte
que parecia querer me levar para os céus...
 
ah, Itaquara azul
Itaquara verde
 
nos casebres de palha da Rua do Cemitério
infestados de percevejos
eu descobria tudo que era belo e eterno
 
Itaquara mapa
Itaquara tempo
 
...e um velho me contava histórias
pelas tardes afora e a sombra da algarobeira
era do tamanho do universo...
 
ah, Itaquara riso
Itaquara sonho
 
e havia serenatas de amor
nos jardins, nas noites claras
e as estrelas se banhavam nuas na lagoa
 
Itaquara céu
Itaquara cores
 
...e ele vinha com seu jeep vermelho
e dava uma volta na nossa rua
eu e Zé Perequeté na garupa éramos felizes
e achávamos que todas as pessoas eram felizes
e que o mundo era do tamanho de nossa rua
 
ah, Itaquara vau
Itaquara lua
 
e um dia fomos escondidos tomar banho num
 aguadouro
no meio da serra, no mangueiro de seu Jaime Almeida
— onde o gado bebia água — e sujos de esterco e de
 lama
descobríamos o que era a vida
 
Itaquara chuva
Itaquara flor
 
e passavam as boiadas de seu Lu vindas de Goiás
ou do Mato Grosso, e a cidade inteira parava
para assistir a gigantesca boiada se arrastando
 lentamente
os vaqueiros aboiando e a boiada andando pela
 velha estrada
e como era belo aquele antigamente!
 
ah, Itaquara rosa
Itaquara vida
 
foi numa tarde de cor amarela
que eu conheci a mais que bela e ela me deu um
 arco-íris
e quanta vida vivida e esquecida...
 
ah, Itaquara da minha infância para sempre perdida!
ah, Itaquara ombre
Itaquara soleil

bananes pourrissant au soleil sur les étals
vieillards aux yeux profonds à leur fenêtre
seules les horloges à balancier parlaient du temps

il y avait des enfants dans les rues chantant des rondes
"Trois, trois, passera
le dernier y restera
bon vacher, bon vacher".

Itaquara terre
Itaquara vent

...et par de rares après-midis
je faisais se cabrer des cerfs-volants de papier
et le vent était si fort
qu'il semblait vouloir m'élever jusqu'aux cieux...

ah, Itaquara azur
Itaquara vert

Dans les paillotes de la Rue du Cimetière
infesté de punaises
j'ai découvert tout ce qui était beau et éternel

Itaquara carte
Itaquara temps

... et un vieil homme m'avait raconté ses aventures
loin dans la soirée et l'ombre du bayarone1
avait la taille de l'univers...

ah, Itaquara rire
Itaquara rêve

et il y avait des sérénades d'amour
dans les jardins, par les nuits claires
et les étoiles se baignaient nues dans le lagon

Itaquara ciel
Itaquara couleurs

... et il venait avec sa Jeep rouge.
et faisait demi-tour dans notre rue
moi et Zé Perequeté à l'arrière étions heureux
et nous pensions que tous les gens étaient heureux
et que le monde avait la taille de notre rue.

ah, Itaquara gué
Itaquara lune

et un jour, cachés nous nous baignâmes dans
  un trou d'eau
au milieu des collines, dans le corral de Jaime Almeida
– où le bétail buvait son eau – souillés de bouse
  et de boue
nous avons découvert ce qu'était la vie

Itaquara pluie
Itaquara fleur

Et puis les troupeaux de Lu sont passés, venant de Goiás
ou du Mato Grosso, et toute la ville s'est arrêtée
pour regarder le gigantesque troupeau s'approcher
  lentement.
les vachers attroupant et le troupeau marchant le
  long de la vieille route
et comme ils étaient beaux ces jours anciens !

ah, Itaquara rose
Itaquara vie

ce fut un soir de couleur jaune
que je connus la plus belle qui m'a donné un
  arc-en-ciel
et combien de vie vécue et oubliée...

ah, Itaquara de mon enfance à jamais perdue !
________________

Giovanni Fattori
Les troupeaux de la Maremme (1893)
...

Aucun commentaire:

Enregistrer un commentaire

Nuage des auteurs (et quelques oeuvres)

A. M. Pires Cabral (44) Adélia Prado (40) Adolfo Casais Monteiro (36) Adriane Garcia (40) Affonso Romano de Sant'Anna (41) Al Berto (38) Albano Martins (41) Alexandre O'Neill (29) Ana Cristina Cesar (38) Ana Elisa Ribeiro (40) Ana Hatherly (43) Ana Luísa Amaral (40) Ana Martins Marques (48) Antônio Cícero (40) António Gedeão (37) António Ramos Rosa (39) Augusto dos Anjos (50) Caio Fernando Abreu (40) Carlos Drummond de Andrade (43) Carlos Machado (106) Casimiro de Brito (40) Cecília Meireles (37) Conceição Evaristo (33) Daniel Faria (40) Dante Milano (33) David Mourão-Ferreira (40) Donizete Galvão (41) Eugénio de Andrade (34) Ferreira Gullar (39) Fiama Hasse Pais Brandão (38) Francisco Carvalho (40) Galeria (27) Gastão Cruz (40) Gilberto Nable (46) Hilda Hilst (41) Inês Lourenço (40) João Cabral de Melo Neto (43) João Guimarães Rosa (33) João Luís Barreto Guimarães (40) Jorge de Sena (40) Jorge Sousa Braga (40) José Eduardo Degrazia (40) José Gomes Ferreira (40) José Saramago (40) Lêdo Ivo (33) Luis Filipe Castro Mendes (40) Manoel de Barros (36) Manuel Alegre (41) Manuel António Pina (32) Manuel Bandeira (39) Manuel de Freitas (41) Marina Colasanti (38) Mário Cesariny (34) Mario Quintana (38) Miguel Torga (31) Murilo Mendes (32) Narlan Matos (85) Nuno Júdice (32) Nuno Rocha Morais (435) Pássaro de vidro (52) Poemas Sociais (30) Poèmes inédits (252) Reinaldo Ferreira (22) Ronaldo Costa Fernandes (42) Rui Pires Cabral (44) Ruy Belo (28) Ruy Espinheira Filho (43) Ruy Proença (41) Sophia de Mello Breyner Andresen (32) Tesoura cega (35) Thiago de Mello (38) Ultimos Poemas (103) Vasco Graça Moura (40) Vinícius de Moraes (34)