Europa - IV


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Europa - IV
Europe - IV


Eu falo das casas e dos homens,
dos vivos e dos mortos:
do que passa e não volta nunca mais...
Não me venham dizer que estava materialmente previsto,
ah, não me venham com teorias!
Eu vejo a desolação e a fome,
as angústias sem nome,
os pavores marcados para sempre nas faces trágicas
das vítimas.
E sei que vejo, sei que imagino apenas uma ínfima,
uma insignificante parcela da tragédia.
Eu, se visse, não acreditava.
Se visse, dava em louco ou profeta,
dava em chefe de bandidos, em salteador de estrada,
– mas não acreditava!
Olho os homens, as casas e os bichos.
Olho num pasmo sem limites,
e fico sem palavras,
na dor de serem homens que fizeram tudo isto:
esta pasta ensanguentada a que reduziram a terra inteira,
esta lama de sangue e alma,
de coisa e ser,
e pergunto numa angústia se ainda haverá alguma esperança,
se o ódio sequer servirá para alguma coisa...

Deixai-me chorar - e chorai!
As lágrimas lavarão ao menos a vergonha de estarmos vivos,
de termos sancionado com o nosso silêncio o crime feito
instituição
e enquanto chorarmos talvez julguemos nosso o drama,
por momentos será nosso um pouco do sofrimento alheio,
por um segundo seremos os mortos e os torturados,
os aleijados para toda a vida, os loucos e os encarcerados,
seremos a terra podre de tanto cadáver,
seremos o sangue das árvores,
o ventre doloroso das casas saqueadas,
– sim, por um momento seremos a dor de tudo isto...

Eu não sei porque me caem as lágrimas,
porque tremo e que arrepio corre dentro de mim,
eu que não tenho parentes nem amigos na guerra,
eu que sou estrangeiro diante de tudo isto,
eu que estou na minha casa sossegada,
eu que não tenho guerra à porta,
– eu porque tremo e soluço?

Quem chora em mim, dizei - quem chora em nós?

Tudo aqui vai como um rio farto de conhecer os seus
meandros:
as ruas são ruas com gente e automóveis,
não há sereias a gritar pavores irreprimíveis,
e a miséria é a mesma miséria que já havia...
E se tudo é igual aos dias antigos,
apesar da Europa à nossa volta, exangue e mártir,
eu pergunto se não estaremos a sonhar que somos gente,
sem irmãos nem consciência, aqui enterrados vivos,
sem nada senão lágrimas que vêm tarde, e uma noite
à volta,
uma noite em que nunca chega o alvor da madrugada...

Je parle des maisons et des hommes,
des vivants et des morts :
ce qui passe et ne revient jamais...
Ne me dites pas que cela était matériellement prévu,
ah, laissez là vos théories!
Je ne vois que désolation et faim,
des angoisses sans nom,
la peur qui s'imprime à jamais sur la face tragique
des victimes.
Et je sais que je vois, je sais que je n'imagine qu'une infime,
une insignifiante parcelle de la tragédie.
Moi, si je la voyais, je n'y croirais pas.
Si je la voyais, je deviendrais fou ou prophète,
je deviendrais chef des brigands, bandit de grand chemin,
– mais je n'y croirais pas !
Je regarde les hommes, les maisons, les animaux.
Je regarde avec un ébahissement sans limite,
et je suis sans voix,
dans la douleur d'être homme, eux qui firent tout cela :
cette pâte ensanglantée à quoi ils ont réduit la terre entière,
cette boue de sang et d'âme,
de choses et d'êtres,
et je me demande avec angoisse s'il existe encore un espoir,
si cette haine servira à quelque chose...

Laissez-moi pleurer – et je pleure !
Au moins les larmes laveront la honte d'être encore vivant,
d'avoir entériné par notre silence le crime qu'ils ont érigé
en institution,
et peut-être par nos pleurs ce drame pourra-t-il devenir nôtre,
pour un instant sera nôtre un peu de la souffrance d'autrui,
pour une seconde nous serons les morts et les torturés,
les estropiés à vie, les fous et les incarcérés,
nous serons la terre pourrie par tant de cadavres,
nous serons le sang des arbres,
le ventre douloureux des maisons saccagées,
– oui, pour un instant nous serons la douleur de tout cela...

Je ne sais pas pourquoi mes larmes tombent,
pourquoi ce tremblement et ces frissons qui m'envahissent,
moi qui n'ai point de parents ni d'amis partis en guerre,
moi qui suis un étranger face à tout cela,
moi qui suis dans ma maison, tranquille
moi qui n'ai pas de guerre à ma porte,
– moi mais pourquoi ces frissons et ces sanglots ?

Qui pleure en moi, dites - qui pleure en nous ?

Tout ici va comme une rivière fatiguée de connaître
ses méandres :
Les rues sont des rues avec des gens et des voitures,
Il n'y a pas de sirènes déversant des peurs irrépressibles,
et la misère est la même misère qu'il y avait déjà...
Et si tout est pareil à l'ancien temps,
en dépit de l'Europe qui nous entoure, exsangue et martyre,
je me demande si nous ne rêvons pas ce que nous sommes,
des gens sans frères ni conscience, ici enterrés vivants,
sans rien sinon des larmes arrivées trop tard, et une nuit
alentour,
une nuit où les lueurs de l'aube n'arriveront jamais...

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Otto Dix
Guerre (détail du Tryptique) (1929-1932)
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