Poema à mãe


Nom :
 
Recueil :
 
Autre traduction :
Eugénio de Andrade »»
 
Os Amantes sem Dinheiro (1950) »»
 
Italien »»
«« précédent /  Sommaire / suivant »»
________________


Poema à mãe
Poème pour ma mère


No mais fundo de ti,
eu sei que traí, mãe.

Tudo porque já não sou
o retrato adormecido
no fundo dos teus olhos.

Tudo porque tu ignoras
que há leitos onde o frio não se demora
e noites rumorosas de águas matinais.

Por isso, às vezes, as palavras que te digo
são duras duras, mãe,
e o nosso amor é infeliz.

Tudo porque perdi as rosas brancas
que apertava junto ao coração
no retrato da moldura.

Se soubesses como ainda amo as rosas,
talvez não enchesses as horas de pesadelos.

Mas tu esqueceste muita coisa;
esqueceste que as minhas pernas cresceram,
que todo o meu corpo cresceu,
e até o meu coração
ficou enorme, mãe!

Olha – queres ouvir-me? –
às vezes ainda sou o menino
que adormeceu nos teus olhos;

ainda aperto contra o coração
rosas tão brancas
como as que tens na moldura;

ainda ouço a tua voz:
     Era uma vez uma princesa
     No meio de um laranjal...

Mas – tu sabes – a noite é enorme,
e todo o meu corpo cresceu.
Eu saí da moldura,
dei às aves os meus olhos a beber.

Não me esqueci de nada, mãe.
Guardo a tua voz dentro de mim.
E deixo-te as rosas.

Boa noite. Eu vou com as aves.
Au plus profond de toi,
je sais t'avoir trahie, maman.

Trahie car je ne suis pas
le portrait endormi
au fond de tes yeux.

Trahie car tu ignores
qu'il y a des lits où le froid est sans demeure
et les nuits bousculées par des eaux matinales.

Aussi, parfois, les mots que je te dis
sont durs, très durs, maman,
et notre amour est malheureux.

Trahie d'avoir perdu, au portrait-souvenir
les roses blanches que je pressais
contre mon cœur

Si tu savais combien je les aime ces roses, peut-être
ne remplirais-tu pas les heures de mauvais songes.

Mais il y a tant de choses que tu as oublié ;
tu as oublié que mes jambes ont grandi,
que tout mon corps a grandi,
et jusqu'à cœur.
Il est énorme, sais-tu maman !

Regarde – veux-tu l'entendre ? –
je suis parfois encore le petit garçon
qui s'endormait dans tes yeux;

encore écloses et si blanches
les roses près de mon cœur
comme celles de ton portrait ;

J'entends encore ta voix:
     Il était une fois une princesse
     Au milieu d'une orangeraie ...

Mais – tu sais – la nuit est immense,
et tout mon corps a grandi.
Et je suis sorti du cadre,
j'ai donné mes yeux à la soif des oiseaux.

Je n'ai rien oublié, maman.
Je garde ta voix au dedans de moi.
Et je te laisse les roses.

Bonne nuit. Je pars avec les oiseaux.

________________

Vincent van Gogh
Vase de roses blanches (1890)
...

Aucun commentaire:

Enregistrer un commentaire

Nuage des auteurs (et quelques oeuvres)

A. M. Pires Cabral (44) Adélia Prado (40) Adolfo Casais Monteiro (36) Adriane Garcia (40) Affonso Romano de Sant'Anna (41) Al Berto (38) Albano Martins (41) Alexandre O'Neill (29) Ana Cristina Cesar (38) Ana Elisa Ribeiro (40) Ana Hatherly (43) Ana Luísa Amaral (40) Ana Martins Marques (48) Antônio Cícero (40) António Gedeão (37) António Ramos Rosa (39) Augusto dos Anjos (50) Caio Fernando Abreu (40) Carlos Drummond de Andrade (43) Carlos Machado (104) Casimiro de Brito (40) Cecília Meireles (37) Conceição Evaristo (33) Daniel Faria (40) Dante Milano (33) David Mourão-Ferreira (40) Donizete Galvão (41) Eugénio de Andrade (34) Ferreira Gullar (39) Fiama Hasse Pais Brandão (38) Francisco Carvalho (40) Galeria (27) Gastão Cruz (40) Gilberto Nable (46) Hilda Hilst (41) Inês Lourenço (40) João Cabral de Melo Neto (43) João Guimarães Rosa (33) João Luís Barreto Guimarães (40) Jorge de Sena (40) Jorge Sousa Braga (40) José Eduardo Degrazia (40) José Gomes Ferreira (40) José Saramago (40) Lêdo Ivo (33) Luis Filipe Castro Mendes (40) Manoel de Barros (36) Manuel Alegre (41) Manuel António Pina (32) Manuel Bandeira (39) Manuel de Freitas (41) Marina Colasanti (38) Mário Cesariny (34) Mario Quintana (38) Miguel Torga (31) Murilo Mendes (32) Narlan Matos (85) Nuno Júdice (32) Nuno Rocha Morais (433) Pássaro de vidro (52) Poemas Sociais (30) Poèmes inédits (250) Reinaldo Ferreira (11) Ronaldo Costa Fernandes (42) Rui Pires Cabral (44) Ruy Belo (28) Ruy Espinheira Filho (43) Ruy Proença (41) Sophia de Mello Breyner Andresen (32) Tesoura cega (35) Thiago de Mello (38) Ultimos Poemas (103) Vasco Graça Moura (40) Vinícius de Moraes (34)